O Contrato de Licenciamento de Software torna-se cada vez mais importante para as empresas atuantes em qualquer setor do mercado marcarem sua presença no ambiente digital. Isto também se aplica às atividades internas da empresa, pois praticamente todas as atividades e funcionalidades que utilizamos em um computador são provenientes de diferentes softwares.
Em função disto, muitas empresas desejam usufruir de bons softwares que possam cumprir suas necessidades, mas não contam com equipes internas de desenvolvimento. Assim, algumas das soluções possíveis são a contratação de “Software Houses” para produzirem um software específico para a empresa contratante, em um contrato de desenvolvimento de software, ou o licenciamento de softwares já existentes, por meio de contratos de licenciamento de software.
Neste artigo vamos explicar o que são os contratos de licenciamento de software, algumas de suas principais características e das exigências legais que os envolvem, bem como os principais pontos que devem ser observados por todas as partes no momento de criar o instrumento que disponibilize a licença para utilização do software.
O que é um Contrato de Licenciamento de Software?
A função principal do contrato de licenciamento de Software é definir e dispor por quais maneiras e sob quais condições um software estará acessível ao público. Enquanto os softwares desenvolvidos como prestação de serviço, por meio de um contrato de desenvolvimento de software, costumam ser de propriedade de quem o contratou, os demais softwares são de propriedade de seus desenvolvedores, e sobre eles recai a proteção presente na Lei do Software e nos demais dispositivos que tratam dos direitos autorais e da propriedade intelectual no Brasil e em tratados internacionais.
Assim, a própria Lei de Software (Lei 9.609/98) afirma que o contrato de licenciamento de Software é o instrumento jurídico por meio do qual o desenvolvedor determina quais vão ser os termos da utilização de seu Software.
O contrato de licenciamento de software deve dispor das responsabilidades do licenciante e dos direitos e deveres do licenciado na utilização do produto licenciado.
De maneira geral, os contratos de licenciamento de Software disponibilizam e limitam o direito de uso do software para o usuário final, tratando sobre:
→ Regras de utilização;
→ Cópias;
→ Acesso e alteração do Código Fonte;
→ Suporte ao usuário e seus direitos;
→ Disposições sobre atualizações e sobre a garantia dos serviços;
→ Punições e sanções cabíveis no caso de descumprimento do contrato;
De acordo com a Lei do Software, estes contratos não podem conter, porém, cláusulas que limitem a produção, a distribuição ou a comercialização, em violação às disposições normativas em vigor; e/ou eximam quaisquer dos contratantes das responsabilidades por eventuais ações de terceiros, decorrentes de vícios, defeitos ou violação de direitos de autor, segundo disposto no art. 10 § 1º.
Softwares Proprietários e Open Source
Existem duas principais características referentes ao licenciamento dos programas de computador: os softwares proprietários e os Open Source, ou de código aberto, em português.
Softwares Proprietários
Os Softwares proprietários são aqueles que apresentam limitações para a sua cópia ou redistribuição, e que tem o acesso à seu código-fonte limitado. O acesso à estas funcionalidades ou a eventual necessidade de efetuar algumas destas ações limitadas depende da autorização do proprietário do software, e pode estar sujeita à pagamentos e taxas.
É importante notar que, mesmo após a criação do contrato de licenciamento de software, o licenciado não se torna proprietário deste. O proprietário do software é sempre seu desenvolvedor, com exceção dos softwares criados por meio de prestação de serviços.
Softwares Open Source
Os Softwares de Código Aberto, ou Open Source, são programas cujo acesso ao código-fonte é amplamente disponibilizado ao público ou aos seus usuários, de modo a permitir a construção colaborativa de programas que compartilham seus códigos-fonte. O fato de um software ser de código aberto não significa, porém, que este é necessariamente gratuito, pois sobre os programas de código aberto podem existir diversas diferentes licenças, desde licenças que permitem o amplo compartilhamento gratuito do programa até licenças que proíbem, por exemplo, a utilização do código-fonte para a criação de venham a ser vendidos em um modelo proprietário.
Contratos de Distribuição
O titular dos direitos sobre o Software pode, por meio de um contrato de distribuição, autorizar que um distribuidor comercialize as licenças sobre o produto em outro país, no qual o distribuidor esteja estabelecido.
O distribuidor, então, torna-se representante do titular dos direitos sobre o Software no país, sendo responsável, mas muitas vezes de modo não-exclusivo, pelo licenciamento do Software com terceiros no país em que está estabelecido.
Principais categorias de licenciamento de Software
A seguir, apresentamos as principais categorias de Licenciamento de Software existentes.
End User License Agreement (EULA)
O EULA, ou Acordo de Licença de Usuário Final, é uma das modalidades mais comuns de licenciamento de softwares proprietários. O EULA muitas vezes surge em um formato de contrato de adesão, ao ser apresentado para o usuário final no momento da instalação do software, geralmente com sua aceitação condicionada aos botões de “aceitar”.
Neste contrato, podem estar presentes diversas cláusulas padrão que devem ser analisadas com cuidado, uma vez que vão desde cláusulas restringindo algumas utilizações do programa e proibindo, por exemplo, a engenharia reversa do código-fonte, até cláusulas que dispõem sobre a permissão para instalação de outros softwares no seu sistema, podendo até mesmo permitir a instalação de malwares e outros programas danosos.
GNU General Public License (GNU GPL)
O GNU GPL é um dos contratos mais utilizados no licenciamento dos softwares de código aberto. Diferente do EULA, não é um modelo de contrato que pode ser modificado à vontade dependendo do software, com a inserção de cláusulas que podem ser prejudiciais ao usuário. O GNU GPL é mantido pela Free Software Foundation, que é responsável pelas atualizações do contrato.
De modo geral, o GNU GPL oferece ao usuário final o direito de 1) executar o sistema; 2) estudar seu código-fonte; 3) modificar o código-fonte; 4) compartilhar livremente o programa com a comunidade.
Mozilla Public License (MPL)
A MPL, utilizada e desenvolvida pela Mozilla Foundation, que desenvolve também, por exemplo, o explorador Mozilla Firefox, é outro modelo de licença que, como o GNU GPL, oferece o livre direito de cópia e compartilhamento do código-fonte.
A licença permite que o usuário use livremente o programa e modifique e distribua o código-fonte, porém, diferente do GNU GPL, não exige que o código seja compartilhado livremente com a comunidade, o que permite que o programa licenciado seja utilizado para a criação de softwares proprietários que venham a ser licenciados à terceiros, desde que creditando os autores do software original.
Not for Resale (NFR)
A licença NFR é útil para o licenciamento de softwares de modo gratuito, mas com diversas limitações. A licença permite o direito de uso ao software sem custo, seja por tempo limitado ou definitivo, porém proíbe a comercialização ou a disponibilização do software para terceiros. Assim, o licenciado pode utilizar livremente e sem custo o software, porém não tem autorização para copiar ou compartilhar seu código-fonte ou sua chave de acesso.
Transferência de Tecnologia de Software
Após alguns embates iniciais sobre a proteção do Software por direito autoral ou por propriedade industrial, uma vez que este pode ser considerado tanto uma forma de expressão literária de seu criador (por meio do código-fonte), quanto uma criação que contém uma função utilitária para a indústria, existindo exemplos de softwares que apresentam somente uma de cada uma destas características, prevaleceu a visão norte-americana de que a proteção do Software se daria pela proteção do direito autoral, análoga à proteção de obra literária.
A posição norte-americana prevaleceu no mundo com a aprovação do Acordo TRIPs, em 1994. Após a assinatura do tratado internacional, o Brasil criou as Leis de Direito Autoral (Lei 9.610/98) e a Lei do Software (Lei 9.609/98).
Sendo caracterizado como obra passível de proteção de direitos autorais, o Software pode ser licenciado, mas sua propriedade não pode ser transferida integralmente, sendo inalienáveis os direitos morais do autor do programa, que seriam os direitos de ter sua autoria reconhecida.
Assim, não podendo alienar seus direitos morais, o titular do Software pode alienar os conhecimentos tecnológicos que estão expressos no código-fonte por meio de um Contrato de Transferência de Tecnologia.
O artigo 11 da Lei de Software dispõe:
Art. 11. Nos casos de transferência de tecnologia de programa de computador, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a terceiros.
Parágrafo único. Para o registro de que trata este artigo, é obrigatória a entrega, por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, memorial descritivo, especificações funcionais internas, diagramas, fluxogramas e outros dados técnicos necessários à absorção da tecnologia.
Lei de Software
Deste modo, o contrato de transferência de tecnologia do software deve ser registrado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), conforme regulamenta o art. 211 da Lei 9.279/96. Como é possível verificar pela leitura do artigo supracitado, os contratos de transferência de tecnologia registrados no INPI podem produzir efeitos em relação a terceiros.
O contrato deve dispor se a transferência será definitiva ou se será restrita, situação na qual deve apresentar sob quais condições e por quanto tempo ocorrerá a transferência.
Contrato de Licenciamento de Software: Contrato de Leasing
Uma opção comum nos contratos de licenciamento de software, e que é muito utilizada por Startups, é o contrato de Leasing. O termo, quando se tratando do licenciamento de softwares, representa um licenciamento temporário com conversão opcional em perpétuo.
Ou seja, se trata de um contrato em que o licenciado tem o direito de uso do software por um prazo determinado e ao fim deste prazo pode negociar com o licenciante a possibilidade de transformar o contrato de licenciamento de software em um contrato de transferência de tecnologia perpétuo. Costuma ser aplicado na prática como um “aluguel” da licença do software, uma vez que mês a mês o licenciado paga o licenciante pelo acesso ao software pelo mês subsequente.
Cláusulas essenciais e pontos de atenção para o Contrato de Licenciamento de Software
Já conhecendo os contratos de transferência de tecnologia, podemos analisar quais cláusulas são essenciais para a proteção de todas as partes envolvidas e quais pontos devem ser observados para a criação de um bom contrato de licenciamento de software.
Algumas das informações que não podem faltar no contrato de licenciamento de software são:
→ Quem são as partes e, no caso de distribuidores ou de softwares que tem mais de um desenvolvedor, a autorização ou participação de todos titulares do software em questão;
→ Modelo geral da licença (EULA, GNU GPL, etc.);
→ Natureza geral do software (os diferentes softwares podem ter especificidades que modificam o contrato, bem como podem exigir cláusulas mais precisas sobre os efeitos da contratação);
→ Duração da licença (se é temporária ou perpétua, bem como disposições sobre possíveis mudanças na duração da licença, como possibilidade de conversão de licença temporária em perpétua ou revogação do direito de uso por quebra do contrato);
→ Disponibilização do código-fonte para auditoria, cópia, modificação ou redistribuição;
→ Responsabilidades dos licenciados e dos licenciantes;
→ Quantidade de usuários que poderão ser beneficiados, possíveis limites ao acesso ao software;
→ Prazo de validade técnica (exigido pela Lei de Softwares em seu artigo 7°);
→ Valores do contrato de licenciamento de software e condicionantes de acréscimos no valor final;
→ Punições e sanções ao descumprimento do contrato;
→ Planos de manutenção, canais de suporte e de contato;
→ Plano sobre atualizações;
→ Cláusula de Propriedade Intelectual;
Responsabilidade na licença de Software para proteção de dados
Uma importante área da Segurança da Informação consiste na gestão de segurança no licenciamento de softwares. A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/18), que entra em vigor agora em agosto, dispõe sobre a necessidade do Compliance na Segurança da Informação, para a proteção dos dados e dos ativos de informação das empresas.
A falta de Compliance na gestão de licenciamento de softwares pode permitir a utilização de programas não licenciados, que podem trazer malwares ou instalar crackers nos dispositivos da empresa, por exemplo. Assim, é importante que sejam seguidas algumas regras e diretrizes para o uso e o licenciamento de softwares:
É importante que haja um controle sobre o acesso e o licenciamento de softwares nas empresas. Os softwares só devem ser baixados ou instalados por profissionais que tenham a permissão de efetuar este tipo de ação na empresa, após passaram por uma avaliação de segurança.
Deve ser considerado se o Software em questão foi desenvolvido na metodologia de privacy by design, se cumprem requisitos e padrões de segurança, se estes padrões de segurança contemplam a proteção de dados, se o software pode possibilitar o acesso de dados da empresa por terceiros ou pelos seus desenvolvedores, entre outros.
Outras medidas que devem ser observadas é o acompanhamento dos softwares utilizados em matéria de vazamentos de dados, bem como o acompanhamento de qualquer possível incidente de segurança da informação que possa afetar seus dados ou os de seus clientes. Também é importante manter uma política de atualização dos softwares, para que estejam sempre sendo utilizadas as versões mais seguras disponíveis.
Por fim, é importante que os próprios contratos de licenciamento de software comprometam os licenciantes à proteção de dados, ao respeito à LGPD e às demais leis de proteção de dados ao redor do mundo.
Sugerimos que, para realizar a elaboração ou revisão de um Contrato de Licenciamento de Software, procure uma Assessoria Jurídica Especializada.
Este artigo “Contrato de Licenciamento de Software“ foi escrito Por Rodrigo Glasmeyer e revisado por MSc. Graziela Brandão Conheça o BL Consultoria Digital, acesse aqui!