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Assédio moral virtual no ambiente de trabalho: como ocorre e quais as consequências para a empresa?

Assédio moral virtual no ambiente de trabalho
Assédio moral virtual no ambiente de trabalho

Com o advento da pandemia do Covid-19, grande parte dos trabalhadores passaram a prestar seus serviços na modalidade de teletrabalho (mais conhecida como home office), de modo que a comunicação diária entre o empregado e empregador também passou a acontecer de forma totalmente virtual, seja por e-mail, serviços de mensageria instantânea como o WhatsApp, chats internos, etc. 

Assim, embora a implementação e popularização do teletrabalho tenha trazido inúmeros benefícios para o empregado e também para as empresas (como, por exemplo, a possibilidade da empresa deduzir as despesas com teletrabalho dos funcionários do seu Imposto de Renda), algumas das questões problemáticas que eram vivenciadas pelos empregados no trabalho presencial infelizmente estenderam-se também para o trabalho remoto – como é o caso do assédio moral. 

A seguir, abordaremos temas relevantes sobre o assédio moral virtual que ocorre principalmente no âmbito do trabalho remoto e como as empresas devem agir para coibir esse tipo de comportamento. 

Assédio moral virtual: o que é e como ocorre? 

Conforme conceitua o Tribunal Superior do Trabalho (a instância mais elevada que realiza o julgamento de temas relevantes que envolvem Direito e Processo do Trabalho) em sua Cartilha de Prevenção ao Assédio Moral, o assédio moral no trabalho é a exposição de pessoas a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente laboral, de forma repetitiva e prolongada no exercício de suas atividades, sendo que a referida conduta traz danos à dignidade e à integridade do indivíduo, colocando a saúde em risco e prejudicando o ambiente de trabalho.

Ainda, é notório que a prática de assédio moral (em qualquer de suas modalidades) interfere diretamente na vida do empregado, seja esta profissional ou pessoal, causando-lhe danos que podem evoluir para graves problemas de saúde e, eventualmente, também podem acarretar a sua incapacidade para o trabalho.

Deste modo, tem-se que o assédio moral virtual é aquele praticado pelo assediador utilizando-se dos meios eletrônicos/virtuais de comunicação (como, por exemplo, o chat interno da empresa, e-mail, ligação telefônica, mensagens via SMS e/ou mensageria instantânea, etc) – muito embora este tipo de assédio também possa vitimar empregados que trabalham na modalidade presencial (durante e após o término de sua jornada de trabalho), o mesmo ocorre majoritariamente com trabalhadores que exercem suas atividades de forma remota, uma vez que o contato com os demais colegas e com o empregador ocorre de forma totalmente virtual/remota. 

Quais práticas podem ser consideradas como assédio moral virtual?

Infelizmente, na atualidade, os assediadores vêm sempre encontrando novas formas de importunar suas vítimas no ambiente de trabalho, sendo que grande parcela dos assédios praticados são travestidos de “brincadeiras” ou tidos como cobranças/exigências “normais” que os superiores realizam aos colaboradores “em prol do crescimento da empresa”. 

Assim, é necessário ter em mente que não existe uma “cartilha” contendo uma lista de condutas que podem ser enquadradas como assédio moral virtual, de modo que é necessário analisar individualmente os casos apresentados a fim de verificar se, naquela situação específica, foi cometido assédio – entretanto, para melhor compreensão da temática, seguem alguns exemplos de situação que claramente podem ser consideradas assédio:

1. A realização de comentários e/ou “brincadeiras” sobre a condição física de um empregado, seja esta feita diretamente para o referido funcionário ou propagada perante outros colaboradores, bem como a associação da imagem do funcionário a fotos ou memes vexatórios veiculados na internet

2. Constante pressão e cobrança para que o colaborador realize as suas atividades e, especialmente, para que esse atinja metas (que em sua grande maioria são inatingíveis), independentemente do lugar, dia e/ou horário (inclusive nas férias e/ou dias de folga do empregado); 

3. A realização de comentários e/ou “brincadeiras” em decorrência da orientação sexual e/ou de gênero dos colaboradores (como, por exemplo, comentários homofóbicos, transfóbicos, machistas, etc); 

4. Questionar e/ou hostilizar reiteradamente, em público ou não, o resultado do trabalho apresentado pelo colaborador – ou, ainda, impedir que o colaborador expresse sua opinião acerca de temas relevantes da empresa, em público ou não, minorando sua participação no ambiente de trabalho a fim de excluí-lo da dinâmica cotidiana da empresa;

5. A realização de comentários vexatórios perante terceiros, especialmente pelo empregador e/ou superior hierárquico, acerca do desempenho profissional de um determinado colaborador no ambiente de trabalho (imputando ao empregado, por exemplo, a qualidade de “preguiçoso”, “folgado”, “lerdo”, “burro”, “dramático”, etc);

6. A exigência de que o colaborador esteja conectado de forma ininterrupta (ou seja, à disposição da empresa mesmo após o término de sua jornada de trabalho) e que apresente respostas imediatas, retaliando-o quando a devolutiva não é apresentada no tempo e forma esperadas. 

Entretanto, é importante reforçar que as situações acima mencionadas são meramente exemplificativas – ou seja, é plenamente possível que outras condutas praticadas no ambiente de trabalho configurem assédio moral virtual e causem inúmeros prejuízos ao colaborador vitimado. 

Quais as consequências de um assédio moral virtual para as empresas? 

Conforme determina a legislação trabalhista vigente, em harmonia com a Constituição Federal e com as diretrizes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), é dever do empregador garantir ao empregado um ambiente de trabalho saudável (ou seja, aquele que preserva a saúde física e mental dos colaboradores) – disto, infere-se que a prática de assédio moral virtual viola o dever acima mencionado, ensejando, assim, a responsabilização da empresa e/ou dos assediadores em decorrência dos prejuízos causados ao colaborador. 

A Justiça do Trabalho vem, de forma constante, agindo no sentido de penalizar as empresas que cometem assédio moral (virtual ou não), seja este realizado mediante ações (empregador e/ou superior hierárquico que assedia diretamente) ou omissões (empregador e/ou superior hierárquico que não reúne os mínimos esforços para coibir o assédio no ambiente de trabalho ou que permanece inerte após o recebimento de uma denúncia). 

Com isso, como forma de “compensar” os prejuízos experimentados pelos colaboradores vitimados pelo assédio moral, os magistrados vêm condenando as empresas ao pagamento de indenização em decorrência dos danos morais sofridos pela vítima – sendo estas, em muitos casos, arbitradas em valores significativos.

A título de exemplo, podemos citar uma decisão da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho proferida em 2022 que condenou uma agência de viagens ao pagamento de indenização no valor de R$50.000,00 a uma consultora de viagens que foi vítima de injúria racial e assédio moral (processo: RR-11813-85.2016.5.09.0002) – no referido processo, dentre os vários assédios cometidos, a colaboradora informou que quando estava grávida a empregadora não permitia que a mesma enchesse sua garrafa de água ou fizesse lanches na cozinha da empresa. 

Ainda, em decisão proferida pela Sexta Turma do TST também em 2022, uma academia de ginástica foi condenada ao pagamento de indenização no valor de R$5.000,00 em favor de um colaborador assediado moralmente com xingamentos pelos sócios da empresa (processo: RRAg-136-37.2017.5.10.0021) – nos autos do processo, o empregado informou que era difamado pelos sócios e que, durante o período de cumprimento do aviso prévio, foi ofendido pelos mesmos (através do sistema de mensageria instantânea WhatsApp) com palavras inapropriadas e ofensivas. 

Assim, é imprescindível que as empresas adotem todas as medidas possíveis e necessárias para evitar o cometimento de assédio moral virtual no ambiente de trabalho e agir rapidamente a fim de mitigar os danos causados pela referida conduta. 

Como a empresa deve agir em casos de assédio virtual no ambiente de trabalho?

Conforme exposto anteriormente, o assédio moral virtual no cotidiano das empresas cresceu consideravelmente após a pandemia do Covid-19, uma vez que grande parte dos trabalhadores passaram a exercer suas atividades de forma remota (em regime de teletrabalho) – assim, (re)surge o dever das empresas de adotar medidas que coíbam esse tipo de comportamento e de acolher os colaboradores vitimados por essa prática. 

Deste modo, tem-se que as empresas deverão, primeiramente, agir de forma preventiva a fim de evitar o assédio moral virtual no ambiente de trabalho – nesse sentido, recomenda-se a aplicação de treinamento e/ou palestras para todos os colaboradores (liderança e liderados) informando quais condutas configuram assédio moral e indicando que devem ser extintas no cotidiano da empresa; ainda, se mostra válido o envio de cartilhas/manuais escritos reforçando o teor do treinamento e/ou palestras, bem como indicando os canais de denúncia de comportamentos desta natureza.

Não obstante a prevenção, é necessário que as empresas atuem na fiscalização contínua do meio ambiente de trabalho virtual a fim de garantir que nenhum empregado está sendo vítima de assédio (conferindo periodicamente, por exemplo, o teor das mensagens que estão sendo trocadas entre os colaboradores via e-mail, chat interno, grupos de mensagens externos, etc) – ainda, não se mostra suficiente somente indicar os canais de denúncia e instruir os colaboradores acerca de seus direitos, sendo também dever da empresa investigar de forma célere e responsável todas as denúncias apresentadas por seus empregados, garantindo sempre o direito de defesa do investigado. 

Igualmente, se constatada a ocorrência de assédio moral virtual após o término das investigações, é dever da empresa punir os assediadores nos termos de seu Código Conduta e/ou da legislação trabalhista vigente, observada a razoabilidade e proporcionalidade na punição – ainda, a punição se mostra imprescindível a fim de que a empresa demonstre para os demais colaboradores sua política de “tolerância zero” em relação a assédio, bem como para que os demais colaboradores vitimados tenham coragem para formalizar sua denúncia e obter a penalização dos responsáveis.

Assim, a fim de garantir que a sua empresa está tomando todas as medidas necessárias para evitar, fiscalizar, investigar e punir o assédio moral virtual no ambiente de trabalho, não hesite em contar com um auxílio jurídico especializado para orientá-lo nesse processo e evitar futuras condenações perante a Justiça do Trabalho e/ou instauração de procedimentos perante o Ministério Público do Trabalho (MPT).

Antônio Cordeiro
Antônio Cordeiro
Advogado, formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Pós-graduando em Direito de Família e Sucessões pela UNIDOMBOSCO e em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Atua na área de Compliance Empresarial e Trabalhista do BL Consultoria Digital

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