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Bossware: Rastrear a produtividade de funcionários por meio de software fere a LGPD?

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Recentemente, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) publicou o guia orientativo Hipóteses Legais de Tratamento de Dados Pessoais com base no legítimo interesse com o objetivo de fornecer diretrizes cruciais para a interpretação e aplicação dessa hipótese legal.

No documento, a ANPD destacou uma situação no âmbito trabalhista, na qual uma empresa faz uso de um software para monitorar as atividades e avaliar a produtividade dos funcionários, conhecido como “bossware”. Sistema que inclui a utilização de webcam e o registro das atividades realizadas nos computadores dos colaboradores.

Segundo a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), essa conduta é considerada abusiva porque essa coleta de dados interfere de maneira excessiva e desproporcional nos direitos e liberdades fundamentais dos funcionários, contrariando suas legítimas expectativas de privacidade, mesmo que tenha sido informada previamente e conste na política de privacidade da empresa.

A ANPD também destaca que essa coleta vai além do necessário para alcançar os objetivos pretendidos, não sendo razoável esperar que o empregador realize tal monitoramento extensivo. Além disso, a agência ressalta que, na relação de emprego, os funcionários estão em posição de maior vulnerabilidade em relação aos seus empregadores, não possuindo meios efetivos para se opor ao tratamento de dados.

Portanto, a ANPD conclui que o tratamento de dados não poderia ser realizado e que não é admissível o recurso à hipótese legal do legítimo interesse, uma vez que as legítimas expectativas dos titulares não foram respeitadas, devendo prevalecer seus direitos e liberdades fundamentais.

Ele é definido como a hipótese em que o controlador realiza o tratamento de dados para finalidades legítimas e específicas, desde que não haja prejuízo aos direitos e liberdades fundamentais do titular dos dados. Assim, o controlador deve respeitar os interesses legítimos dos titulares dos dados e garantir a transparência deste tratamento.

De acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), Lei n° 13.709/2018, quando o tratamento for baseado no legítimo interesse do controlador, somente os dados pessoais estritamente necessários para a finalidade pretendida poderão ser tratados (art. 10, §1º).

O controlador ainda deverá adotar medidas para garantir a transparência do tratamento de dados baseado em seu legítimo interesse (art. 10, §2º). Além disso, a autoridade nacional poderá solicitar ao controlador relatório de impacto à proteção de dados pessoais, quando o tratamento tiver como fundamento seu interesse legítimo, observados os segredos comercial e industrial (art. 10, §3º). Além disso, estabelece o art. 37 que o controlador e o operador devem manter registro das operações de tratamento de dados pessoais que realizarem, especialmente quando baseadas no legítimo interesse.

Portanto, para que o tratamento de dados com base no legítimo interesse seja válido, é necessário que o controlador pondere a necessidade, adequação e proporcionalidade do tratamento em relação aos objetivos que pretende alcançar, considerando a proteção dos direitos do titular dos dados.

Conheça mais sobre as bases legais da LGPD no nosso artigo “As 10 Bases Legais da LGPD para o Tratamento de Dados pessoais”

O Guia orienta a respeito da utilização de software ou ferramentas de monitoramento usadas pelos empregadores para rastrear as atividades dos funcionários. Também conhecido como bossware, esse tipo de software pode monitorar a atividade no computador, registrar o tempo de trabalho, rastrear a localização, monitorar comunicações e até mesmo capturar imagens através da webcam. 

Segundo a ANPD, a coleta dos dados nesse caso vai muito além do necessário para o atendimento das finalidades pretendidas. Logo, não é correto justificar o legítimo interesse para a utilização desse tipo de ferramenta. Isso porque a relação entre empregador e empregado não é exercida de forma igual, assim mesmo que o trabalhador seja informado da utilização de bossware através de contratos, termos ou políticas de privacidade, não irá conseguir inibir sua utilização devido ao tipo de relação estabelecida.

O bossware levanta questões sobre privacidade e ética no local de trabalho, pois pode afetar a confiança e o bem-estar dos funcionários.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não possui legislação específica para o assunto. No entanto, o Direito do Trabalho, entre suas principais funções, estaria a de impedir a exploração do trabalho humano como fonte de riqueza dos detentores do capital, de modo que, originalmente, teria sido concebido como verdadeiro instrumento de proteção do polo mais fraco da relação de trabalho (trabalhador). Atualmente, entende-se que a proteção do trabalhador relaciona-se ao princípio da dignidade humana, de sede constitucional.

Trata-se apenas de um guia orientativo, ou seja, não se refere à natureza de uma decisão ou interpretação legal que obriga outras autoridades ou instâncias a segui-la. No entanto, esse direcionamento demonstra o posicionamento da ANPD diante da utilização dessa ferramenta e servirá para criação de futuras legislações.

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Time BL Consultoria Digital - Direito Digital e Análise Regulatória

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